Resumo: 

  • Um relatório do banco Goldman Sachs analisou o impacto do uso de IA no mercado de trabalho. 
  • Os resultados indicam que a adoção da IA poderia impulsionar o PIB global em quase US$ 7 trilhões durante um período de 10 anos.
  • A inteligência artificial generativa poderia substituir até ¼ do trabalho atual e cerca de ⅔ dos empregos atuais estão expostos a algum grau de automação. 

O banco norte-americano Goldman Sachs lançou em março um dos primeiros estudos a respeito do impacto das inteligências artificiais generativas no mercado de trabalho. O paper se chama The Potentially Large Effects of Artificial Intelligence on Economic Growth e é curto, tem apenas 20 páginas. A SENNO leu o material e traz um resumo destacando as principais ideias e os pontos-chave para facilitar a sua compreensão. Faça o download do relatório neste link

O estudo destaca que ainda existe muita incerteza em relação a efetiva adoção dessas ferramentas digitais baseadas em IA, bem como quais serão os impactos delas na economia, na macroeconomia, no mercado de trabalho e no aumento de produtividade. 

Veja o texto no blog da SENNO sobre o paradigma da produtividade.

O exercício é baseado no mercado americano e europeu – e em alguns casos extrapolado para o cenário global – e sua hipótese principal é que estamos assistindo de perto o nascimento de ferramentas que podem levar a uma automação em massa de tarefas, assim como aconteceu na revolução industrial, no século XVII e na introdução dos computadores no mercado de trabalho, nos anos de 1980. 

Um panorama que somente vai acontecer se as IA generativas cumprirem a sua promessa de fazer o mesmo trabalho de um humano de maneira mais rápida e eficiente. 

“Embora o impacto da inteligência artificial dependa em última análise de sua capacidade e cronograma de adoção, esta estimativa destaca o enorme potencial econômico da inteligência artificial generativa se ela cumprir sua promessa, (…) tem o potencial de perturbar significativamente os mercados de trabalho e estimular o crescimento global da produtividade nas próximas décadas”, escrevem os autores Jan Hatzius, Joseph Briggs, Devesh Kodnani e Giovanni Pierdomenico.

Os números de destaque

Ao se debruçar sobre o ambiente de trabalho nos Estados Unidos, os economistas analisaram bancos de dados que detalham a descrição de mais de 900 ocupações nos Estados Unidos e 200 ocupações no continente europeu. A projeção traz alguns números grandes, que vem sendo compartilhados em redes sociais e nos blogs especializados: 

  • Cerca de ⅔ dos empregos atuais estão expostos a algum grau de automação de inteligência artificial. 
  • A inteligência artificial generativa poderia substituir até ¼ do trabalho atual.
  • Cerca de 300 milhões de empregos poderiam ser automatizados, quando se extrapola o estudo para dados globais. 
  • A inteligência artificial generativa poderia aumentar o crescimento anual da produtividade do trabalho nos Estados Unidos em pouco menos de 1,5 pontos percentuais ao longo de um período de 10 anos.
  • O banco estima que a inteligência artificial poderia eventualmente aumentar o PIB global anual em 7%, algo em torno de US$ 7 trilhões. 
  • A projeção indica que 7% dos empregos nos EUA serão substituídos pela IA, 63% serão complementados e 30% não serão afetados. 

O Goldman Sachs enfatiza que, historicamente, a substituição de trabalhadores pela automação tem sido compensada pela criação de novos empregos e pelo surgimento de novas ocupações, o que tem sido responsável pela maior parte do crescimento do emprego no longo prazo. 

Os autores citam um estudo do economista David Autor, que constatou que 60% dos trabalhadores de hoje estão empregados em ocupações que não existiam em 1940. Para Autor, cerca de 85% do crescimento do emprego nos últimos 80 anos é explicado pela adoção de tecnologias e inovação. 

O relatório afirma que a combinação de (1) economia significativa de custos trabalhistas, (2) criação de novos empregos e a (3) maior produtividade para trabalhadores não substituídos aumenta a possibilidade de um boom de produtividade.

Mas eles reiteram que impulso dependerá do nível de dificuldade das tarefas que IA será capaz de realizar e da quantidade de empregos que serão automatizados. É de se destacar também que nem todo o trabalho automatizado se traduzirá em demissões. 

“Embora o impacto da IA ​​no mercado de trabalho provavelmente seja significativo, a maioria dos empregos e indústrias está apenas parcialmente exposta à automação e, portanto, é mais provável que seja complementada em vez de substituída”, diz o texto. 

Investimento em IA

Até 2021, o investimento privado em inteligência artificial nos EUA e em todo o mundo foi de US$ 53 bilhões e US$ 94 bilhões, respectivamente, representando um aumento de mais de cinco vezes em termos reais em relação a cinco anos atrás. 

Se esse investimento continuar a crescer no mesmo ritmo que o investimento em software na década de 1990, o investimento em inteligência artificial dos EUA poderia atingir 1% do PIB do país até 2030.

Em tempo, boa parte desse avanço se deu devido ao aumento exponencial na capacidade de processamento de computação na nuvem, um cenário que permitiu que modelos de linguagem como o ChatGPT, DALL-E e LaMDA pudessem exercer tarefas mais complexas e com maior precisão. 

Automatizar ou não, eis a questão?

Embora a IA possa ter um impacto significativo no mercado de trabalho, é importante ressaltar que a maioria dos empregos e indústrias não será totalmente substituída pela tecnologia, mas sim complementada por ela. 

Por isso, o paper parte do princípio de que as ocupações que são realizadas ao ar livre ou que exigem muito trabalho físico não podem ser automatizadas por IA.

Isso se deve porque o escopo se fecha no impacto da inteligência artificial generativa e desconsidera uma gama de tecnologias relacionadas, como a robótica. Se o avanço dessas áreas fosse computado, o número de ocupações que poderiam ser automatizadas seria maior.

  • Nesse sentido, as ocupações mais expostas à automação com IA são as administrativas (46%), jurídicas (44%), arquitetura e engenharia (37%), bem como ciências sociais (36%) e setor financeiro (35%).
  • As de menor exposição são profissões que exigem atividades físicas, como construção (6%), manutenção (4%), produção e operários (9%), transporte (11%) e serviços culinários e de preparação de comida (12%).

O texto discute as estimativas de automação de trabalho para o nível global, levando em consideração as diferenças na composição da indústria entre países e excluindo o setor agrícola em economias emergentes.

A conclusão é que menos empregos em economias emergentes estão expostos à automação em comparação com países desenvolvidos. Mesmo assim, a avaliação é que 18% do trabalho global poderia ser automatizado.

 Veja no gráfico abaixo quais são as ocupações mais expostas a automação.

E na divisão dos países, Índia, Quênia, Vietnã e Nigéria são menos afetados, com menos de 15% do trabalho sendo automatizado. Por outro lado, países como Hong Kong, Israel, Japão e Suécia podem chegar a percentuais superiores a 25%. O Brasil pode ter cerca de 20% das ocupações automatizadas. 

Ganho de produtividade nos países emergentes

Os autores acreditam que a IA pode dar vazão a um aumento de produtividade e de crescimento econômico. O primeiro motivo é que a maioria dos trabalhadores está empregada em ocupações parcialmente expostas à automação da IA. Ou seja, esse grupo poderá usar a sua capacidade em atividades que aumentam a produção.

Já os trabalhadores que perderam emprego para a automação deverão ser reempregados em novas ocupações que surgem diretamente da adoção da IA – que tendem a ser profissões com maior nível de produtividade.

Historicamente, a tecnologia tem suprimido empregos a uma taxa mais rápida do que criado oportunidades, embora tenha havido um equilíbrio entre na primeira metade do período pós-guerra, especialmente nos Estados Unidos.

O que os autores sugerem é que a IA generativa pode ter efeitos negativos na demanda por trabalho no curto prazo, semelhante aos avanços anteriores no campo da tecnologia da informação, como o uso de PCs em contraponto às máquinas de escrever. Apesar destes possíveis efeitos negativos, a adoção da IA pode impulsionar o crescimento da produtividade do trabalho e a criação de novas ocupações no longo prazo.

“A combinação de economia significativa de custos trabalhistas, criação de novos empregos e aumento de produtividade para trabalhadores não deslocados levanta a possibilidade de um boom na produtividade do trabalho, assim como aconteceu com o surgimento de tecnologias de propósito geral anteriores, como o motor elétrico e o computador pessoal”, afirma o texto. 

Os economistas conseguiram ainda extrapolar a análise realizada nos Estados Unidos para outros países e consideraram as diferenças na composição do mercado de trabalho para explicar a maior parte das variações no crescimento da produtividade. 

O crescimento anual da produtividade global é estimado em 1,4 pontos percentuais durante um período de 10 anos. No entanto, é esperado que economias emergentes tenham um impacto mais tardio em relação a essa adoção. O Brasil, de acordo com o gráfico abaixo, deve ficar um pouco acima da média, ficando atrás de Coréia do Sul, Chile e Argentina.

Aplicando essa taxa de acréscimo da produtividade a um rol de 30 países que se conseguiu a estimativa de aumento de 7% no PIB global anual durante um período de 10 anos, algo como US$ 7 trilhões. 

Conclusão

Embora o exercício use de metodologias calcadas na ciência e matemática, os próprios autores afirmam que ainda existe um cenário de incerteza em relação à capacidade da IA generativa, seu tempo de adoção e a ação de outros fatores que ainda não foram analisados em profundidade. 

Em resumo, o relatório destaca o enorme potencial econômico da adoção generalizada da IA generativa. No entanto, é importante lembrar que os efeitos reais da adoção da IA podem ser diferentes e que a automação de tarefas pode levar ao deslocamento de empregos e à necessidade de adquirir novas habilidades e conhecimentos. 

Temos, portanto, um cenário típico do mundo VUCA e o sucesso desta nova jornada com IA dependerá da capacidade de países, empresas, indivíduos e sociedade em transformar esses desafios em oportunidades e aproveitá-las ao máximo para alcançar seus objetivos.