Resumo:
- Inovação não é só fazer melhor, mais rápido ou mais tecnológico. É preciso ter uma nova significação para o mesmo produto.
- Quem defende essa tese é o professor italiano Roberto Verganti, que publicou em 2009 o livro Design Driven Innovation.
- Para conseguir obter novos significados com produtos e serviços inovadores, o que o framework do design driven innovation foca no conceito de ‘intérpretes’.
- Os intérpretes são figuras que entendem e moldam profundamente os mercados em que trabalham.
Quando se estuda inovação, a literatura traz uma análise clássica: as inovações breakthrough e radicais são criadas a partir de novas tecnologias, enquanto as inovações incrementais são, normalmente, uma resposta para uma demanda do mercado.
Mas existe uma nova teoria que estuda a inovação pelo viés do design, que desmente a afirmação acima e nos traz uma nova interpretação para o fenômeno da inovação. O framework design driven innovation é uma visão bem original sobre a gestão da inovação e nos diz que:
- A inovação não deve ser uma resposta à demanda do mercado, ao contrário, ela cria mercados.
- A inovação não é implementada somente com base em um novo conjunto de tecnologias, mas sim a partir de novos significados.
O autor da tese é o italiano Roberto Verganti, que publicou em 2009 o livro Design Driven Innovation. Ele é professor gabaritado em três faculdades de ponta: a Stockholm School of Economics, a Harvard Business School e a Politecnico di Milano School of Management, além de ser consultor para companhias como Ferrari, Ducati, Procter & Gamble, Unilever, Gucci, entre outras.
A sua obra traz uma série de argumentos de como o design pode criar valor, uma visão, que nas palavras do autor, “traz uma mudança radical de perspectiva que nos introduz uma ousada forma de competir”.
Uma das primeiras coisas que precisamos entender sob essa nova perspectiva de inovação, é o conceito de significado. Vamos lá.
Índice
O que são os significados?
Para Verganti, inovação não é só fazer melhor, mais rápido ou mais tecnológico. É preciso ter uma nova significação para o mesmo produto. Ou seja, o público consumidor não compra apenas produtos ou serviços, mas adquirem novos “significados” ou propósitos (meaning em inglês).
Trocando em miúdos, as necessidades das pessoas não são satisfeitas apenas pela forma e função, mas também pela experiência.
Ele explica melhor seus ensinamentos em um TED Talk promovido pela Universidade Politécnica de Milão. Na aula, Verganti, de maneira teatral, traz alguns exemplos de como a abordagem do design ajuda a desenvolver produtos melhores, a partir da mudança de significado.
Dê o play no vídeo para conferir.
Para ilustrar como funciona a relação entre inovação e significado, Verganti fala sobre o mercado de velas, que foram muito comuns no passado. Elas funcionavam com uma iluminação de ‘backup’(reserva), caso a energia elétrica falhasse. Hoje em dia, a rede elétrica é quase ubíqua e os blecautes são cada vez mais raros. Soma-se a isso, a popularização dos smartphones, que contam com a funcionalidade de lanternas.
Esses dois fatores somados poderiam explicar o desaparecimento do mercado de velas como um todo. Mas as pessoas nunca compararam tantas velas como atualmente. Por quê?
Por conta de uma mudança de significado: no passado, as velas eram um produto substituto para lâmpadas; hoje elas são um modo de expressar seu estilo de vida e proporcionar um ambiente com uma iluminação mais aconchegante e romântica.
Mas a teoria não é aplicada somente para velas. Em artigo na Harvard Business Review, publicado em 2011, o autor italiano fala que Steve Jobs era também um mestre em achar novos significados para os produtos da Apple, tanto para clientes, como para seus colaboradores.
“Gerenciar em busca do significado é reconhecer que as pessoas são humanas: elas têm dimensões racionais, culturais e emocionais e apreciam a pessoa que cria um significado para elas abraçarem. Sabemos que os clientes não compram produtos da Apple simplesmente por causa da utilidade ou funcionalidade; as pessoas tendem até a perdoar algumas das limitações técnicas da Apple em troca de um excelente design – e identidade. Para Jobs, design não era apenas beleza, mas também criava novos significados para os usuários”.
Ele cita algumas inovações da Apple orientadas por essa premissa de achar novos significados como o iMac G3, uma televisão translúcida; o iPod somado com o Itunes, que tornou acessível baixar música, quando antes era necessário fazer downloads em sites obscuros; e principalmente o iPhone, que transformou ‘o significado dos smartphones de objetos para negócios em objetos de entretenimento social’.
Como o design driven funciona na prática?
Para conseguir obter novos significados com produtos e serviços inovadores, o que o framework do design driven innovation foca no conceito de ‘intérpretes’.
São figuras que entendem e moldam profundamente os mercados em que trabalham, como assim o fez Steve Jobs. Mas esses intérpretes não precisam ser necessariamente CEOs ou diretores-executivos de grandes empresas; jornalistas, engenheiros, cientistas e até artistas são pessoas que têm o poder de formar uma opinião e decidir novos rumos para um mercado.
Para Verganti, é preciso olhar e respeitar o feedback dos clientes, mas ir além e traçar uma estratégia para conseguir chegar no coração desses intérpretes. O primeiro passo é ouvir eles. Confira abaixo como a metodologia do design driven divide o processo de inovação:
- Ouvir e acessar o conhecimento dos intérpretes.
- Identificar e apontar a origem da necessidade ou da oportunidade para inovar.
- Interpretar e desenvolver um novo significado ou design.
- Difundir e buscar a disseminação de um novo significado ou design.
- Contagiar, isto é, a capacidade de dispersar o novo significado depois de difundido.
Ouvir: É a ação de acesso ao conhecimento sobre novas possibilidades e significados do produto através da interação com os intérpretes. As empresas que escutam bem são aquelas que desenvolvem relações privilegiadas com um distinto grupo de intérpretes-chave.
Identificar: As empresas de sucesso são aquelas que identificam os intérpretes em áreas onde os concorrentes não estão buscando. Os principais intérpretes são pesquisadores voltados para o futuro, que estão desenvolvendo a inovação muitas vezes para seus próprios propósitos. As empresas que realizam inovações impulsionadas pelo design são capazes de detectar, atrair e interagir melhor com os principais intérpretes do que seus concorrentes.
Interpretar: É o processo no qual o conhecimento acessado pela interação com os intérpretes é recombinado e integrado com as percepções, tecnologias e ativos próprios de uma empresa. Em muitos aspectos é mais parecido com o processo de pesquisa de engenharia, mas trabalhando com significados em vez de tecnologias.
Difundir: O resultado da metodologia design driven é o desenvolvimento de um significado novo para um produto ou serviço, com vistas a criar uma proposta de valor única. Mas essa inovação baseada em significado pode, inicialmente, confundir as pessoas. Por isso é tão importante difundir esse novo significado para que o mercado assimile aquela novidade e faça uso dele.
Contagiar: A última etapa da metodologia é transformar o ambiente externo. Os intérpretes já conseguiram criar uma nova visão para a empresa, a partir de um novo significado. Mas é preciso também mudar um contexto mais amplo, com os stakeholders de fora da organização e fazer com que se crie tecnologias, produtos ou serviços a partir dessa inovação de significados.
Microsoft: de patinho feio à excelência
O exemplo da Microsoft pode ilustrar como funciona a metodologia na prática. A Microsoft fez uma pesquisa para ouvir os usuários e descobriu que os seus programas tinham como ponto fraco a usabilidade, pois seriam difíceis demais para um usuário casual.
A empresa americana criou, então, uma linguagem de design focada nos lemas “Menos é mais”, inspirada na Escola Suíça de Design Gráfico, e “O conteúdo é a interface”. Angariou, assim, outras empresas desenvolvedoras, que se adaptaram à identidade visual criada.
Um fato curioso (e irônico) é que Steve Jobs falava da dona do Windows como uma empresa que não investia em design como uma forma de criar novos significados.
“O único problema com a Microsoft é que eles simplesmente não têm gosto. Eles não têm absolutamente nenhum gosto. E não quero dizer que de uma forma pequena, quero dizer que de uma forma grande, no sentido de que eles não pensam em ideias originais, e não trazem muita cultura para seus produtos”.
Hoje, a Microsoft é conhecida e reconhecida pela sua excelência em design, nos lançamentos de hardware e de software. Ou seja, a metodologia design driven foi uma reviravolta criativa para a companhia, impulsionado assim a geração de valor.
Inovações como o Surface Duo, por exemplo, ilustram como a empresa de Redmond tenta encontrar um novo significado, inovar em um mercado já estabelecido e, em última instância, definir o futuro da computação móvel, ao lançar um smartphone diferente, com duas telas, voltado para a produtividade.
Diferenças entre Design Driven e Design Thinking
A partir da década de 2000, ganhou evidência um leque de abordagens que usam o design como fonte de inovação e de solução criativa para problemas.
Muita gente tem dúvidas sobre as diferenças entre os conceitos de design driven e do design thinking. As duas teorias já foram testadas e validadas por milhares de companhias e cada abordagem cria diferentes tipos de valor.
O design thinking trata da habilidade de inventar novas formas de agir que alteram (mudam) a situação (ou o produto) atual para melhor. Já a metodologia do design driven é baseada na criação de novos significados e infere que produtos e serviços têm mais valor a oferecer do que a sua função. No design thinking, por sua vez, esse significado é criado a partir da experiência de uso.
O processo do design driven é focado nos intérpretes, criando habilidades para entender e influenciar, a partir do contexto sociocultural e tecnológico, como as pessoas atribuem significado aos produtos.
Já o design thinking caracteriza-se pela centralidade no usuário, na iteração para testar e otimizar a solução, na interdisciplinaridade como forma de enriquecer a visão da equipe e na combinação de pensamento analítico e intuitivo. Explicamos bastante sobre o conceito neste post do blog da SENNO.
Confira uma tabela extraída de um artigo de Cristiano Porto Klanovicz.
Conclusão
Podemos agrupar a definição de design em torno de três áreas: design como forma das coisas, design como uma abordagem criativa para a solução de problemas e design como uma maneira de dar sentido às coisas.
Essa última atribuição do design remonta a própria etimologia da palavra: em latim “de + signare”, o que significa “fazer algo”, “distinguir por um signo”, “dar-lhe significado”.
A interpretação também é respaldada pelo escritor e conferencista britânico John Hesket, que diz que “o design pode ser definido como a capacidade humana de moldar e fazer nosso ambiente de maneiras sem precedentes na natureza, para atender às nossas necessidades e dar sentido às nossas vidas”.
O mais interessante é que a inovação orientada pelo design traz perspectivas novas. Não se considera a inovação como resultado de um processo de resolução de problemas ou de técnicas de ideação, mas de um processo de interpretação e leitura de fatores sociais, econômicos, tecnológicos e mercadológicos.
Ao introduzir essa dimensão sociológica, a abordagem de design driven explica que inovação acontece por meio de interações com a sociedade, mercados e organizações e que esses significados vão mudando ao longo do tempo.
Nesse sentido, ser o primeiro a lançar uma nova tecnologia é menos importante do que ser o primeiro a encontrar o significado mais relevante dessa tecnologia.
E você, consegue ser um intérprete do mercado a sua volta? Um dos propósitos da SENNO é ajudar os intérpretes a trilhar o caminho da inovação de maneira eficaz. Entre em contato conosco para conhecer nossos serviços e produtos voltados para inovação.